quarta-feira, 24 de março de 2010

A família e a Igreja (Texto Inaugural)

Coluna "Pense..."(Texto: 01)

Bem, o que me cabe nessas palavras é nada mais que falar das nossas nobres famílias tradicionais que utilizam de artifícios legais para preservar e não “contaminar” o seu doce e belo sangue ou para suas propriedades não sair da família casando entre si seus filhos, filhas, netos e netas geralmente até o 3° grau, mantendo seu elevado status de instituição exemplar. E da Igreja; linda entidade a qual todos nós temos em nossos corações a imagem ideal de casa de Deus. O que aparentemente pode parecer uma unidade familiar exemplar e digna de modelo para qualquer outra, esconde um tipo perfeito de hipocrisia. A instituição familiar, sendo modelo ideologizado pela Igreja e pelo resto da Sociedade, é a mesma que trata como “perdidos” aqueles que não fazem parte do seu rebanho. Como cães, as famílias casam seus primos com filhos, tios com sobrinhos para legitimar, com a graça de Deus sob os olhos da Igreja e o bem olhar da sociedade hipócrita e rica, a proteção da propriedade e do sangue intocável e puro. A família, que tem como propósito perfeito gastar tanto mais com suas vestes quanto menos com sua alimentação, adora manter o status de família modelo da Igreja perante as outras famílias. A filha desonrada ou o marido fracassado são, acima de tudo, tratados como o câncer que a família não conseguiu tratar. Estes são convidados a não pertencer mais a elas, exclusos dos aristocráticos eventos das mais fabulosas famílias da cidade. Ao nosso câncer, só lhe resta à casa de Deus, ambiente fascinante e que promete sempre a cura. O que deveria ser um espaço agregador, acaba por se tornar um ambiente coercitivo e deplorável. A filha desonrada, que teve como principal culpa que a levará certamente ao inferno foi sentir prazer. O sonho dessa doce menina de entrar na casa de Deus, a casa de todos, para se casar de branco, não se realizará jamais. A comunidade a julga por ser de carne e osso, muito embora o que diferencia nossa triste “meretriz” das demais mães de famílias foi não saber esconder o que fez. Negligenciada da igreja e da família só lhe resta dois caminhos: se esconder pelo resto da vida no porão de sua casa ou o suicídio propriamente dito. Neste ultimo caso, aquela que era modelo de tudo que não se pode ter em uma família se tornará a mártir da cidade e ser-lhe-á feito um busto na praça da igreja. As amigas que se afastaram irão ao seu funeral com suas sinuosas vestimentas de exuberante poder e luxuria. Duas comadres comentarão, na forma de cochichos, aquilo que a defunta fez e não fez. As filhas das comadres conversarão, com toda a certeza, perante o corpo frio e rígido sobre os detalhes de sua mortuária e não sobre suas reais virtudes. Já o padre, esse pobre ser humano que lhe é vetado os melhores prazeres que a vida pode proporcionar, freqüentará a casa da família por algumas semanas para confortá-la. Debaixo da sua batina, quando for dormi, lembrará das melhores moças da sua cidade. O pobre padre, por ser um humano normal, no primeiro sinal de uma ereção, tratará de curar a sua “doença” rezando exaustivamente e chicoteando suas finas costas. No outro dia, ao acordar, tratará de procurar uma outra família para arrebanhá-la e freqüentar sua igreja. Detentor dos mais poderosos segredos da cidade será o amigo da família do prefeito e do amante da primeira dama. Sabendo das patifarias da esposa, nosso pároco negligenciará seus pecados em troca de benefícios à paróquia. A comadre, quem tem como oficio saber tudo o que se passa na cidade, será capaz de fazer do “homem da igreja” o seu amante por uma noite em troca de uma boa fofoca. Entre a cruz e a espada, o reverendo pensará com muito carinho na troca de informação por prazer. A casa de Deus poderá ser palco dessa feitoria. Depois da nossa senhorita que perdeu sua honra, não nos esqueçamos daquele marido fracassado que a essas alturas já está mendigando um pouco de dinheiro, pão ou carne que divide ferozmente com um cão. Abandonado pela sua família, e expulso da santa casa de Deus, o marido fracassado encontra conforto nas ruas da cidade. Aos domingos, ele participará das missas longe da santa casa e ao meio de toda a guerra de belas roupas, nosso amigo faz bom uso do seu já surrado terno que uma vez ele se casou e hoje se faz abandonado e negado pela própria existência. Seus amigos de infância não o reconhecem mais. A bela senhora que uma vez ele a desposou o despreza com veemência. Mesmo assim, o falido senhor reza pela alma dos cristãos. Depois de cumprir com o seu papel dominical e hipócrita após o sermão, onde diz que a casa de Deus é a moradia dos homens, o padre fecha as portas da paróquia e contabiliza as doações. Enfim, o homem já se encontra morto e podre na porta da igreja, há quem diga que foi fome e tem aqueles que falam ter sido moléstias. Depois de fedendo e incomodando o nariz de todos aqueles que freqüentam os arredores da igreja, o nosso senhor padre faz o melhor beneficio ao nariz de todos os bons cristãos daquela cidade; paga uma carroça com o sagrado dinheiro da paróquia para retirar o corpo desse fétido ser. Enterrado e cumprido todo o seu dever de cidadão na terra, sua monstruosa cerimônia funerária foi financiada pela igreja e como testemunha desse rito, lembra-se de apenas um reclamante senhor suado e feio que teve como principal tarefa nesse dia enterrar o pobre homem na promessa de diminuição de pena que cumprira por roubos e assaltos. A cada dia nossa cidade espera por homens que, nessas condições, comportam o combustível necessário para mantê-la viva. Por fim, deixo um forte abraço a todos aqueles que ilustram formidavelmente esses exemplos, embora não sejam de fato reais.

Vão em paz e que o senhor vos acompanhe!


Filipe Saul

Contudo, agradeço a Filipe Saul por esta pérola. Incentivo e espero desde já novas contribuições.

2 comentários:

  1. Depois deste texto que é um "soco no estomago" para reflexão... Nada melhor que retribuir a gentileza em forma de oração!

    Oremos:

    Senhor tende piedades da filha desonrada e do pai fracassado, mas tendes ainda mais piedade daqueles que não sabem que seu templo é o corpo de nossos irmãos... Que não entendem a disseminação de vossos propósitos, que não contemplam a luz da caridade aos perdidos... Tendes piedades das famílias que não conhecem o perdão e tendes mais piedade das igrejas que se julgam vossa representante na terra e se esqueceram do caminho que leva ao céu!!!!!

    Independentemente se existes ou não... Peço piedades... Posso não conhecer das coisas tuas, mas conheço as coisas que dizem que são tuas e essas me enojam!!!

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  2. É com intensa satisfação que venho recomendar este texto doloroso (pelos fatos) e irreverente (pela forma contada).

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